quarta-feira, 2 de setembro de 2020

Todo o meu caminho diante de mim - C. S. Lewis

 



Encontramos aqui o Lewis pré-cristão; através de suas anotações em seus diários entre os anos de 1922 a 1927, acompanhamos seu cotidiano dos 24 aos 31 anos, numa Oxford pós-guerra que procurava fazer sentido e se reconstruir. Percebemos um cristianismo "latente" ou adormecido em Lewis, uma vez que, tendo sido educado e ainda mostrando a influência da religião, passava por uma fase agnóstica. Pelas páginas de seu "leitário", como ele chamava, andamos em sua companhia pelos caminhos de Oxford, seja à pé, de bicicleta ou de outros meios de transporte. Quase podemos compartilhar com ele de uma boa Guiness num pub local, discutir poesia, literatura, filosofia, religião e outros tantos assuntos. Podemos visualizar "Jack" lendo enquanto caminha, em seu escritório, na biblioteca, memorizando passagens, alternando a leitura de vários livros. 

Também somos testemunhas de suas incertezas com relação à carreira, suas dificuldades no lar e na vida intelectual. Mas também vamos conhecendo os primórdios desse grande intelectual em formação, já leitor poliglota, mas ainda incerto com relação ao que o futuro lhe reserva. 

Podemos perceber resquícios de histórias que seriam muito bem exploradas no futuro, como a "peça de horror" tratando da ideia de uma cabeça funcionando à parte do corpo, o que apareceria no último volume da Trilogia Cósmica, escrita mais de 20 anos depois num contexto de debate filosófico. 

Sentimos um Lewis descobrindo o encantamento da natureza cotidiana enquanto passeia nos mais diversos climas tipicamente ingleses e nos pegamos curiosos com a confusão espiritual desses anos. Descobrimos seu interesse primordial na temática da ética. Dois pontos que surgem de passagem apontam para as alegrias do futuro: a amizade de Tolkien, que num primeiro momento aparece à Lewis como alguém "que precisa de um pouco de sabor" (p. 507) e a "paz e o conforto" apontados no epílogo por Walter Hooper, após a mudança para The Kilns, o feliz lar que Lewis e a Sr. Moore passaram muito tempo. 


Em questões formais, o livro é muito bonito e bem editado, como os outros volumes da Thomas Nelson. A edição original, por Hooper, é cuidadosamente trabalhada, e a versão brasileira, com abundantes notas do tradutor é primorosa. A tradução também está muito boa. 

Um pequeno detalhe que poderia ser diferente: as referências ao apêndice biográfico nas notas de rodapé ficaram carregadas e distrai a leitura desnecessariamente. Um asterisco ao lado do nome, no corpo do texto faria o trabalho.


Enfim, é uma ótima adição aos fãs e estudiosos que querem aprofundar na formação intelectual de Lewis anterior à sua entrada como professor em Oxford. Mais uma grande edição à coleção de livros das edições especiais da Thomas Nelson Brasil.


Ed. Thomas Nelson Brasil, 2020, 634 pgs.

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